Amizade nossa ele não queria acontecida simples, no comum, no encalço. Amizade dele, ele me dava. E amizade dada é amor. G. Rosa

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Cinema contra a homofobia?

Cinema contra a homofobia?

O Ministério da Saúde francês decidiu financiar curtas-metragens para lutar contra a homofobia e o suicídio entre os jovens. Mas como criar imagens capazes de um tal feito?


“Jovem e homossexual sob o olhar dos outros”. O título deste projeto não poderia ser mais claro. Este conjunto de cinco curtas-metragens nasceu da iniciativa do Ministério da Saúde francês em 2008, que propôs aos jovens enviar roteiros com o tema acima. Os mais de 3000 projetos foram lidos, e cinco foram selecionados por psicólogos, membros de associações gays e personalidades do cinema, além do cineasta francês André Téchiné, abertamente homossexual, coordenador do projeto. O resultado foi exibido na televisão a cabo e em alguns cinemas de arte, restringindo os filmes a um público com poder aquisitivo e formação cultural mais elevados.

Não caberia aqui denunciar o didatismo de um projeto que não pretende ser mais do que isso: um objeto pedagógico de “luta contra a homofobia”, segundo o site oficial. O mais interessante é ver as consequências da pedagogia no cinema, pensar na noção de um cinema útil e intervencionista – cinema este que, embora ferramenta de ensino, beneficia dos mesmos canais e dos mesmos meios de produção de qualquer outro filme financiado com fundos públicos. Os filmes são todos, diga-se de passagem, bastante profissionais e competentes tecnicamente.

Inicialmente, deve-se dizer que os jovens gays são sempre os protagonistas dos curtas-metragens, algo que não era necessariamente imposto, já que o tema implicava o embate entre a visão dos gays e a visão “dos outros”. Estes jovens, todos belos, são majoritariamente homens, majoritariamente de classe média-alta, brancos, com famílias estruturadas e tradicionais (mãe a pai no café presentes na mesa do café da manhã, irmãos etc.). Reservam-se exceções para o papel não ser taxado de elitista ou burguês: existe um negro, uma habitante de classe baixa, e uma garota. Todos expõem suas dificuldades e seus conflitos nas telas. A primeira constatação é de que, para se constituir como o oposto do ataque preconceituoso, o respeito pelo homossexual passa uma forma de exposição das fraquezas, por retratos intimistas, por uma espécie de cinema na primeira pessoa do singular.

Esta forma de “delicadeza”, termo aliás bastante utilizado nas traduções brasileiras de filmes com temática gay, implica a visão da homossexualidade essencialmente como amor gay. Todos os jovens das cinco histórias, portanto adolescentes entre 13 e 18 anos em média, descobrem a preferência pelo mesmo sexo através de uma primeira história de amor, e não de um desejo sexual até então desconhecido. Não há masturbações, corpos descobertos, não há pulsão. Talvez para combater a visão majoritária de que homossexuais são hipersexuados, escolhe-se a abordagem menos realista para as histórias de amor heterossexuais, mas que parece se tornar subversiva neste caso: as paixões à primeira vista, os primeiros flertes, o primeiro beijo.

A questão “olhar dos outros” é das mais brandas. Alguns insultos são proferidos, mas geralmente pronunciados entre amigos e sem consequências graves. Nada de agressão, violência, nem grande angústia do jovem gay. Os protagonistas são muito mais frustrados pelo amor não concretizado do que pela dificuldade de inserção social. No único episódio em que os pais recorrem à violência física, a cena é rápida e logo em seguida o filho agredido sai de casa, passeia alegremente na rua, sorri para o céu azul e afirma ter orgulho de quem é. Nenhuma relação se estabelece entre as duas cenas: a vergonha alheia e o orgulho próprio parecem conviver sem intervir um no outro.

Por fim, não é surpreendente que todos os curtas sejam incrivelmente otimistas, o que implica uma forma de deus ex machina das mais ingênuas: os colegas de escola homofóbicos aceitam a orientação do colega (vide imagem acima) porque o professor insiste que a homossexualidade é normal, a garota lésbica encontra uma namorada, mesmo o garoto em dificuldades encontra o super-herói (literalmente) que lhe salva, no único curta fantástico dos cinco. A noção de “lutar contra a homofobia” foi percebida como “oferecer à sociedade imagens positivas”, sem confrontá-la com seus próprios preconceitos (o que provavelmente faria o espectador mudar de canal) ou pensar nas reais implicações sociais e nas raízes da homofobia.

Face à dificuldade de se agir de maneira eficaz na moral de uma sociedade católica e conservadora, o filme pretende oferecer o mundo como ele poderia ser, sem questionar o mundo como ele é. Os “jovens e homossexuais sob o olhar dos outros” ficam tristes com o preconceito, mas depois se apaixonam, suas histórias de amor dão certo e tudo termina bem para os jovens, para as comunidades intolerantes das histórias, para os eventuais espectadores homofóbicos dos curtas e também para o Ministério da Saúde, que cumpre seu papel ao fazer um esforço pela “luta contra o preconceito”.

Jeune et homo sous le regard des autres (2010)
Curtas-metragens franceses dirigidos por Pascal-Alex Vincent (“En Colo”), Rodolphe Marconi (“Basket et Maths”), Xavier Gens et Marius Vale (“Fusion Man”), Celine Sciamma (“Pauline”) e Sébastien Gabriel (“Omar”).

Por Bruno Carmelo, editor do blog Discurso-Imagem.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

PROVÉRBIOS III

Barriga (Ventre)



Barriga cheia, feijão (goiaba) tem bicho.


Barriga cheia, cara alegre. Barriga vazia não conhece alegria.


Barriga grande não dá entendimento e pode dar sofrimento.


Barriga inchada não é fartura.


Barriga que não leva dois jantares, facada nela.


Barriga vazia não tem alegria.


A barriga não tem ouvidos.


Barriga cheia, cara alegre. Barriga vazia não conhece alegria.


Barriga cheia (quente), pé dormente.


Barriga grande não dá entendimento e pode dar sofrimento.


Barriga inchada não é fartura.


Barriga que não leva dois jantares, facada nela.


Barriga vazia não tem alegria.


Barriga cheia... cara alegre.


Barriga farta... pé dormente.


Não tenhas mais olhos do que barriga.


No tempo quente refresca o ventre.


O ventre em jejum não ouve a nenhum.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Casal de sargentos gays responde a Bolsonaro

Outras palavras publicou:
4 de abril de 2011

Em entrevista ao Congresso em Foco, Fernando Alcântara e Laci Marinho dizem que as falas do deputado fluminense são uma reação de uma cúpula conservadora — e cada vez mais minoritária — das Forças Armadas


Para Fernando e Laci, sargentos e gays, Bolsonaro é porta-voz de uma minoria da cúpula do Exército que tem uma visão autoritária e conservadora do mundo

Por Rudolfo Lago


Laci Marinho, nascido no Rio Grande do Norte há 39 anos, é um sargento do Exército. Fernando Alcântara, pernambucano de 37 anos, é também sargento do Exército. Eles são a prova viva de que o ódio do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) aos homossexuais não é, como ele esforça-se para expressar, um sentimento comum a todo e qualquer soldado das Forças Armadas. Porque Laci e Fernando são, eles próprios, homossexuais. Eles são um casal. “A verdade é que a visão ultrapassada de Bolsonaro reflete hoje o pensamento de uma minoria dentro das Forças Armadas. Mas, infelizmente, uma minoria que tem muita influência”, diz Fernando. Para ele, esse pensamento conservador, resquício da mentalidade de militares mais velhos, que fizeram sua carreira durante a ditadura, é muito forte na cúpula das Forças Armadas, entre os seus comandantes. Na tarde de sexta-feira (1), ele e Laci deram uma entrevista exclusiva ao Congresso em Foco.


Para Fernando e Laci, Bolsonaro tem sido uma espécie de porta-voz não formal do pensamento dessa elite militar. “Eles armam o circo, e Bolsonaro, o palhaço, se apresenta”, ataca Laci.


Fernando e Laci tornaram-se famosos em agosto de 2008. Na capa da revista Época, eles viraram o primeiro casal de homossexuais a assumir claramente a sua opção. A entrevista que deram à revista foi a forma escolhida pelo casal para denunciar a situação que viviam. Por conta da sua opção sexual, os dois vinham sendo perseguidos. A homossexualidade foi a desculpa encontrada, contam eles, principalmente para calar Fernando. Considerado então um militar de reputação ilibada, com várias condecorações, Fernando tornou-se responsável por uma seção do Exército que autorizava, no plano de saúde, cirurgias de alto custo. Verificou a existência de um esquema de fraudes nessas autorizações. Ao denunciar o fato, ele conta que começou a ser perseguido. “Fizeram uma devassa na minha vida para encontrar fragilidades. E a fragilidade encontrada foi a minha homossexualidade”, diz ele.

Companheiro de Fernando, Laci era mais frágil. Tinha a saúde afetada por um problema neurológico. Iniciou-se um processo para minimizar os problemas de saúde de Laci, para obrigá-lo a trabalhar mesmo doente. Como Laci não conseguia comparecer ao serviço quando estava doente, foi considerado desertor, e chegou a passar 58 dias preso. Por conta da homossexualidade, foi Laci quem primeiro chamou a atenção. Nas suas horas de folga, ele tinha uma banda, onde fazia cover da cantora Cassia Eller. Hoje, ele tenta obter a reforma – aposentadoria – por conta da doença. Já Fernando preferiu desistir de enfrentar um processo disciplinar e deixou o Exército.


Para ambos, sua situação, por mais que os tenha feito sofrer, é o sinal de que as mudanças que acontecem na sociedade refletem-se também nas Forças Armadas. E a agressividade de Bolsonaro é uma reação a essas mudanças. Ou talvez, como sugere Laci, uma reação particular de cunho psicológico. “Tenho plena convicção de que ele é um gay internalizado. Que, sozinho, em frente ao espelho, ele diz: “Eu sou uma bichona!’”.


Na entrevista abaixo, percebe-se que Fernando é mais falante que Laci, mas também bem mais diplomático:


Congresso em Foco – Toda vez que surgem polêmicas como essas das declarações de Jair Bolsonaro, surge a ideia de que a carreira militar é incompatível com a homossexualidade. Como vocês respondem a essa ideia?


Fernando - O deputado Bolsonaro é uma voz remanescente de uma turma que está vinculada a um pensamento ultrpassado, arbitrário, antidemocrático. A questão da opção sexual jamais vai definir o caráter de qualquer profissional, independentemente do ramo de trabalho. O que existe nas Forças Armadas é um grande tabu, vinculado à ideia da necessidade de uma certa virilidade para o combate. Dissemina-se a ideia de que um homossexual não teria a autoridade necessária para o comando.

E isso é verdade?


Fernando – Existem líderes militares históricos, comandantes de grandes exércitos, que eram homossexuais. O caso, por exemplo, de Alexandre, o Grande. A tropa, de um modo geral, conhecia a sua orientação sexual, e isso jamais o impediu de ter grandes vitórias militares. É verdade, era um outro tempo, uma outra cultura. Essa perseguição à homossexualidade cresce com o cristianismo. Mas o fato é que a opção homossexual de Alexandre, o Grande, o não o impediu de ser um grande soldado. Além disso, é uma grande mentira achar que os únicos dois homossexuais no Exército éramos eu e o Laci.


Vocês não são um caso isolado, então?


Fernando – Estamos longe de sermos um caso isolado. O fato de nós dois termos saído do armário, como se diz, não significa que eu deva cobrar o mesmo de outros que não queiram fazê-lo. Mas a gente conhece ene casos de até generais que são homossexuais. Eu já vivi experiências muito desconfortáveis de ter sido assediado dentro da caserna. E nem por isso deixei de obedecer ao comando dessas pessoas. Claro, não se pode aceitar assédio, porque é um comportamento que não cabe em nenhuma profissão. Mas não é pelo fato de ser homossexual que essa pessoa não tenha capacidade de comando.

Há, então, um comportamento hipócrita?


Fernando – E que se torna extremamente autoritário para quem enfrentar a hipocrisia e assumir a verdade das suas opções. As Forças Armadas estão inseridas na nossa sociedade. Não pode prevalecer essa visão ultrapassada de Bolsonaro de uma instituição à parte do resto da sociedade, com regras e leis próprias.


Mas Bolsonaro certamente deve falar por uma parcela da sociedade e das Forças Armadas …


Fernando – O que eu acredito é que o Bolsonaro queria ganhar exposição. Duvido que ele tivesse mesmo confundido a palavra negra dita por Preta Gil pela palavra gay. Isso é altamente improvável. Ele realmente buscou uma aparição pública. É típico de políticos inescrupulosos como ele. O Bolsonaro é que é o verdadeiro Tiririca. E aqui não quero de modo algum desmerecer o Tiririca. É que o palhaço, de fato, é ele. É claro que existem, sim, débeis mentais – não dá para usar outra palavra – que votam nele. Afinal, me parece que ele já tem sete mandatos. Mas isso precisa mudar. E está mudando.


Mas ainda seria muito forte o preconceito nas Forças Armadas?


Fernando – Quantos comandantes negros nós tivemos? Quantas mulheres em postos de comando? Ninguém. Mas eu acredito que a fala de Bolsonaro hoje é representativa de um pequeno grupo. Mas de um pequeno grupo que ainda tem muita capacidade de influência. Não é muito diferente de como pensam os principais comandantes e generais do Exército. O Bolsonaro funciona como um mal necessário. Ele não reflete o comportamento institucional do Exército que até,por força da disciplina, evita se manifestar em questões polêmicas. Como o Bolsonaro não tem esse compromisso, aciona-se ele. Curioso que o Bolsonaro se diga representante dos militares, enalteça tanto os militares, e já há muito tempo ele não seja um militar.


Ele não seria tanto assim representante dos militares?


Fernando – Não no sentido de realmente discutir e ser capaz de concretizar os anseios dos militares. Por que, por exemplo, ele não discute por que o soldado, na ativa, não possa votar e ser votado? O soldado é cidadão de segunda classe? Por que não discute o absurdo de um soldado ser preso disciplinarmente e não ter direito a habeas corpus? De não ser julgado pela mesma justiça dos demais cidadãos? Por que não discute os códigos militares obsoletos? A questão da remuneração dos militares, cada vez mais aviltada?


Laci – Eu penso que Bolsonaro, na verdade, é um malandro que finge ser representante dos militares para viver de dinheiro público. Como militar, que eu ainda sou, eu vejo que ele é totalmente desacreditado na instituição. Ele é usado pela cúpula para dar esses recadinhos, pra fazer esse auêzinho. Mas, no meio, ele é desacreditado. Acham que ele é um palhaço.


Fernando – A gente fica buscando algo de concreto que ele tenha feito pela família militar, e não acha.


Laci – Ele tem o circo montado. Ele é o palhaço para angariar os votinhos dele. Na verdade, eu tenho plena convicção de que, na verdade, o Bolsonaro é um gay internalizado, um homossexual dentro de uma concha.


Você tem convicção disso? Que o ódio dele aos homossexuais vem daí?


Laci – Ele vê no espelho um homossexual e quer matar, destruir ele mesmo. A voz dele tem que ecoar para os quatro cantos do mundo e dizer: “Eu não sou isso! Eu não sou isso!”. Mas quando ele olha no espelhinho dentro de casa, ele deve dizer: “Eu sou uma bichona!” Ele deve ficar com vontade de quebrar o espelho. Garanto que ele quebrou muitos espelhos na cada dele.


Fernando – Quando você é heterossexual convicto, porque a homossexualidade vai lhe incomodar tanto?


Em contrapartida, como, de fato, repercute no meio militar a situação de vocês? Há apoio a vocês no meio militar?


Fernando – Às vezes, é difícil para a sociedade civil entender o que acontece no meio militar. A obediência no meio militar se dá muitas vezes pelo medo. Um comandante pode mandar prender um soldado por até 30 dias sem dar satisfação a ninguém. Então, as pessoas se retraem. Elas dão apoio velado. Nós sentimos que tivermos um grande apoio, mesmo que velado. E houve gente que se expôs e deu apoio explícito. E pagaram um preço alto por isso. Por exemplo, um major médico que atendeu o Laci e viu que ele estava doente, e que não era verdade a história de deserção, que teve prejuízos sérios por essa posição.


O que pode acontecer com quem claramente se manifesta, por exemplo, a favor de vocês?


Fernando – Há diversas formas de punição, também veladas. Pode-se alegar um outro motivo para punir. Ou mesmo criar dificuldades para a vida do militar. Imagine o transtorno que é para um militar, por exemplo, que está com a sua vida estruturada, filhos na escola, ser de uma hora para outra transferido para outra cidade. Muitas vezes, alega-se a necessidade dessa transferência para punir alguém. E o soldado, para manter a sua vida estável, se cala. É mais fácil a pessoa se acovardar. No caso do Laci, 18 médicos se envolveram para criar a história de que ele era um desertor. Cumprimento do dever não tem outro nome, às vezes, que covardia, não ter coragem de reagir a isso. Por outro lado, se você reage, acontece como está acontecendo conosco. O que eu vou fazer da vida? Eu tenho 15 anos de vida no Exército, com uma ficha considerada irrepreensível, diversas condecorações. Nunca fiz outra coisa. Não sei fazer outra coisa. Então, a gente não pode ser tão taxativo ao condenar quem se cala. Mas não deixa de ser uma forma de covardia.


Quando vocês entraram no Exército, vocês já tinham assumido a orientação sexual de vocês? Como isso surgiu?


Fernando – No meu caso, foi muito difícil a descoberta da homossexualidade. Eu vim de uma família muito católica, muito conservadora. A Igreja é muito perversa nesse sentido, de que tudo é pecado, que se desvia da dita normalidade. Então, no meu caso, essa descoberta durou muito tempo. Quando eu entrei no Exército, eu ainda não tinha essa convicção do que de fato eu era como ser humano. Eu sentia necessidade de experimentar, mas não tinha coragem. O despertar aconteceu já nas Forças Armadas. E o que isso mudou na minha carreira militar? Nada. Isso me traz uma mágoa muito grande. Por que, de uma hora para outra, eu já não era mais o soldado de ficha ilibada, com medalhas por bons serviços prestados à Nação?


E no seu caso, Laci?


Laci – Para mim, foi uma coisa mais natural. Antes de entrar no Exército, já sentia atração por pessoas do mesmo sexo. Na minha juventude, meus relacionamentos eram com mulheres, mas eu tinha atração por homens. Eu não tive problema na cabeça com relação a isso. Se eu gostasse de uma mulher, ficaria com uma mulher. Se gostasse de um homem, ficaria com um homem. Na minha cabeça, era assim.


Na sua cabeça. E na prática?


Laci – Na prática, a gente começou o relacionamento em 1997. Foi o primeiro relacionamento assim.


E a perseguição, como começou?


Fernando – O ano que marcou tudo foi 2006. Desde 2001, o Laci tinha um problema neurológico que o afastava de algumas atividades. Ele tem umas síncopes, umas vertigens, que o atacam de vez em quando. E durante muito tempo, o Exército aceitou isso. Em 2006, ele ficou de cama um bom tempo. Mas, na verdade, a perseguição começou sobre mim.
Sobre você?


Fernando – Eu era gerente de um sistema de saúde que autorizava cirurgias de algo custo. E verifiquei que havia um esquema de fraudes. A coisa foi tomando uma proporção muito grande que saiu do controle. Como começou a crescer, atingir muita gente, começaram uma verdadeira devassa na minha para me atacar. Buscavam um ponto fraco. E o ponto fraco foi a questão da homoafetividade. Antes de nós começarmos a nos relacionar, nós morávamos juntos, numa república. E, embora depois a gente não confirmasse a nossa relação, começaram os comentários. A coisa foi ganhando uma proporção cada vez maior. Aí, para encobrir a corrupção que havia na questão da autorização para cirurgias de alto custo, começou a perseguição. “Tem que perseguir esses dois viados filhos da puta”, como disseram. A coisa começou com punições rotineiras. Chegou atrasado, não fez determinado exercício, etc. A maioria abaixa a cabeça. E isso é a razão dos diversos suicídios que acontecem no meio militar. A diferença é que não abaixamos a cabeça. Ao contrário, fomos cada vez reagindo mais. A gente resolveu enfrentar a situação. E a gente percebeu que a forma melhor de enfrentar era dizer a verdade. Porque a verdade incomoda muito. Então, procuramos a revista Época para explicitar a verdade. Nós já tínhamos procurado o Ministério Público. Mas a justiça é extremamente lenta. Então, nós fomos à imprensa para denunciar nossa situação como forma de nos defendermos.


E isso resolveu?


Fernando – Houve mais perseguição. Houve uma ordem para sermos transferidos, para nos separar. Eu iria para São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, e ele para o estado de São Paulo. A Procuradoria dos Direitos do Cidadão barrou essa transferência. E, aí, diante da doença do Laci, foi mais fácil partir para cima dele. Dizer que não havia doença nenhuma, e caracterizar as ausências dele como deserção. Puniram ele para me calar. Quando a coisa se tornou insuportável, procuramos a revista Época. Nosso relacionamento e a denúncia do que estávamos passando virou capa da revista. Foi aí que eu creio que se armou uma armadilha para nós.

armadilha?


Fernando – Nós fomos convidados a ir a São Paulo para dar uma entrevista ao programa de Luciana Gimenez, na rede TV!, logo depois da publicação da revista. O Laci, para o Exército, era tido como foragido, porque ele era classificado como desertor. Para ir para São Paulo, providenciamos a saída por Goiânia, porque se saíssemos por Brasília, Laci seria preso no aeroporto. Nós combinamos rotas de fuga com a emissora para o caso de se tentar cumprir a ordem de prisão de Laci. Mas, ao contrário, enquanto o programa acontecia, a emissora foi sendo cercada. Um aparato extremamente desproporcional. Laci saiu da emissora preso. Ele foi primeiro para um hospitla militar em São Paulo. Mas, no dia seguinte, às 6h do hospital, um helicóptero pousou e nos levou para o aeroporto. De lá, fomos colocados num avião Bandeirantes, de lançamento de tropa de paraquedistas, e não sabíamos para onde nós iríamos. Passa tudo pela cabeça da gente nessa hora. Nos levaram para Belo Horizonte. Eu só fiquei mais tranquilo depois que o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) entrou e nos protegeu. Mas, quando chegou o fim de semana, estávamos já em Brasília, levaram Laci para o quartel. Deram uma surra nele. Tortura. Saco plástico na cabeça. Ficou lá preso 58 dias. Até que o Superior Tribunal Militar mandou que ele fosse solto. Foi uma grande vitória. Abre precedentes para outros casos de deserção, porque há um entendimento firmado de que o desertor tem que ficar 60 dias presos pelo menos esperando o processo. Essa decisão abre precedentes para outras. Enfim, nós tivemos situações constrangedoras, mas muita coisa foi conquistada. Nossa história vai ser levada até maio para a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Nossa proposta é condenar o país por esses abusos. Porque o Exército é uma instituição do governo brasileiro. A estrutura governamental foi extremamente condescendente com esse estado de coisas.

O desejo de vocês, ao final do processo, é a reincorporação às Forças Armadas?

Fernando – No caso do Laci, ele ainda é soldado.Na ativa?


Laci – Estou na ativa. De licença médica, agora.


Fernando – Eu saí. Fui obrigado a sair. Eles começaram um processo de expulsão. Seria um processo demorado. Enfrentar esse processo iria me atrapalhar. Na defesa de Laci. Eu depois escrevi um livro. Eles me deram uma porta de saída. Eu saí.


Laci – No meu caso, há um processo de reforma, por meus problemas de saúde. Eu, normalmente, já deveria ter sido reformado – aposentado – pelos meus problemas de saúde. Mas isso não aconteceu por conta dessa perseguição.


Fernando – O que a gente sofreu, não há dinheiro que pague. Vai ficar marcado para o resto das nossas vidas. O reconhecimento da perseguição homofóbica ajudaria a diminuir esse sentimento de injúria que sofremos. E serviria como exemplo para outros casos não aconteçam. Porque, insisto, o nosso caso não é um caso isolado.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

A UESB SAI NA FRENTE...

Sobre o decreto do governador Jacques Wagner que  pode  nocautear  a educação no estado da Bahia.


Abaixo, nota pública divulgada pelos alunos da UESB em 30 de março de 2011 e links para sites sobre o movimento


No dia 29 de março de 2011, nós, estudantes de diversos cursos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, fomos às ruas para mostrar nossa indignação com a situação em que se encontra a universidade pública. Fizemos manifestações durante todo o dia, paralisando as atividades acadêmicas da universidade em todos os turnos e marchando pela avenida Olívia Flores, além de realizarmos assembleias para decidir os rumos da nossa organização. A manifestação contou com a participação de mais de 300 estudantes. Os estudantes dos campi de Itapetinga e Jequié também estão mobilizados e paralisaram a universidade nesse mesmo dia. Além da nossa pauta histórica por assistência estudantil e por melhores condições estruturais e administrativas na universidade, reivindicamos contra a atual política educacional do Governo do Estado.

Em 09 de fevereiro deste ano, o Governo da Bahia editou o decreto 12.583/11 e, pouco tempo após, a Portaria 001 que o regulamenta. Cortando verbas para as empresas públicas, o decreto impede a contratação de professores substitutos (impedindo a saída dos professores para qualificação) e a mudança de regime de trabalho de professores para Dedicação Exclusiva (diminuindo a disponibilidade de professores para a pesquisa e extensão). Além disso, corta gastos com água, energia, xerox, cursos, seminários, capacitação e treinamento dos servidores públicos, telefone, assinatura de revistas e jornais, ônibus e demais veículos da universidade. Tais contenções chegam a 30%!!! Essas disposições irão piorar ainda mais as condições já precárias das universidades baianas, além de ferir a autonomia universitária. Isso demonstra qual lugar ocupa a educação no rol de prioridades do governo, e qual o projeto de educação ele implementa – o de total esfacelamento da universidade pública.


Diante disso, nossas reivindicações são:

PELA REVOGAÇÃO IMEDIATA DO DECRETO 12.583/11;

Contra o aumento do preço da tarifa de ônibus e pela melhoria dos serviços de transporte;

Contra os preços abusivos e a comida de má qualidade das lanchonetes e do restaurante universitário;

Por melhores condições na residência estudantil e pela reformulação, com participação dos estudantes, do seu edital que, por excesso de burocracia, impede o acesso aos estudantes.

Pelo pagamento em dia das bolsas de auxílio, monitoria, pesquisa e extensão;

Pela transparência acerca da administração do orçamento da universidade;

Pela criação e manutenção de projetos de pesquisa e extensão.

Pela construção de salas de aula e laboratórios que atendam à demanda estudantil;

Pela regularização do quadro de professores (atualmente faltam 46 professores) e contratação de mais docentes;

Pela diminuição do preço abusivo da xerox;

Por melhores condições de acessibilidade e de infra-estrutura para os estudantes portadores de necessidades especiais;

Pelo aumento imediato do número de livros da biblioteca;

Em defesa de uma universidade pública, gratuita e de qualidade, contra o seu sucateamento e terceirização dos seus serviços!

Movimento Estudantil Unificado da UESB



Provébios II

Fome


A barriga não tem ouvidos.


A fome alheia me faz perder a eira.


A fome alheia me faz prover a minha ceia.


A fome boceja a fartura arrota.


Antes fome do que sede.


Antes fome que fastio.


A fome é boa cozinheira.


A fome é o melhor tempero.


A fome é boa mostarda. (Boa mostarda é a fome.)


A fome não tem lei.


Antes podrido... que mal comido.


Asno com fome cardos come.


Fome e esperar fazem rabiar.


De fome não vi morrer, mas sim de muito comer.


Estômago vazio não tem ouvidos.


Amanhã jejua o preto, ainda bem que não é hoje.


A ádem, a mulher e a cabra é má coisa sendo magra.


Bem jejua quem mal come.


As tripas pelejam na barriga.


Cozinha moderada, casa bem governada.


A fome alheia me faz prover minha ceia.


A fome não espera pelo tempo da fartura.


A necessidade não tem lei, mas a fome sobre todas pode.


Boca sem queixas é um moinho sem mó.


Lobo faminto não tem assento.


Não há fome que não dê em fartura.


Pardal que tem fome... vem abaixo e come.

domingo, 3 de abril de 2011

Coisas da Política

De olhos opacos no turbilhão do mundo


Mauro Santayana

O engenheiro baiano José Carlos Aleluia enviou carta ao Reitor da Universidade de Coimbra, protestando contra a concessão do título de Doutor Honoris-Causa ao operário Luis Inácio da Silva, que, com o apelido afetivo de Lula, presidiu ao Brasil durante oito anos. Sem mandato, Aleluia mantém contatos com seus eleitores, mediante um site na Internet.

Ele foi um oposicionista inquieto, ocupando, sempre que podia, a tribuna, no ataque ao governo passado, dentro da linha sem rumo e sem prumo do DEM. Aleluia considera uma ofensa às instituições acadêmicas o titulo concedido a Lula, e faz referência elogiosa à mesma homenagem prestada ao professor Miguel Reale. Esqueceu-se, é certo, de outros brasileiros honrados pela vetusta universidade, como Tancredo Neves. Não é preciso conhecer a teoria de Freud para compreender a escolha da memória de Aleluia.

O título universitário é, hoje, licença profissional corporativa. O senhor Aleluia está diplomado para exercer o ofício de engenheiro. A Universidade o preparou para entender das ciências físicas, e é provável que ele seja profissional competente, tanto é assim que ministra aulas. O título universitário certifica que o graduado estudou tal ou qual matéria, mas não faz dele um sábio. O conhecimento adquirido na universidade é importante, mas não é tudo. Volto a citar, porque a idéia deve ser repetida, os versos de um escritor mais identificado com a direita do que com a esquerda, T.S. Elliot, nos quais ele mostra a diferença entre ser informado, conhecer e saber: Where is the wisdom we have lost in knowledge? Where is the knowledge we have lost in information? *

O título de Doutor Honoris-Causa, sabe bem disso o engenheiro Aleluia, não é licença profissional, mas o reconhecimento de um saber, construído ao longo do tempo, tenha o agraciado ou não freqüentado a universidade. O papel da Universidade não deveria ser o que vem desempenhando – o de conferir certificados de preparação técnica -, mas o de abrir caminho à busca do saber. O Senador Christovam Buarque, com a autoridade de quem foi reitor da UNB, disse certa vez que a Universidade ideal será aquela que não expeça diplomas.

Lula, com os seus defeitos, e não são poucos, é um doutor em política. Um chefe de Estado não administra cifras, não faz cálculos estruturais, não prolata sentenças, nem deve escrever seus próprios discursos. Cabe-lhe liderar os povos e conduzir os estados, e isso dele exige muito mais do que qualquer formação escolar: exige a sabedoria que desconfia do conhecimento, e o conhecimento que se esquiva das informações não confiáveis.

A universidade é uma instituição relativamente nova na História. Ela não foi necessária para que os homens, com Demócrito, intuíssem a física atômica; com Pitágoras e Euclides, riscassem no solo figuras geométricas e delas abstraíssem os teoremas matemáticos; e muito menos para que Fídias fosse o genial arquiteto e engenheiro das obras da Acrópole e o escultor que foi. Mais ainda: as maiores revoluções intelectuais e sociais do mundo não dependeram das universidades, embora nelas se tenham formado grandes pensadores – e sua importância, como centro de reflexões e pesquisas, seja insubstituível. O preconceito de classe contra Lula sela os olhos de Aleluia e os torna opacos.

Solidário o meu autodidatismo com o de Lula, quero lembrar o grande escritor norte-americano Ralph Waldo Emerson: um talento pode formar-se na obscuridade, mas um caráter só se forma no turbilhão do mundo.

É no turbilhão do mundo que se forma o caráter dos grandes homens.

Fonte: Jorna do Braisil

Link: http://www.jb.com.br/jb-premium/noticias/2011/04/01/mauro-santayana-coisas-da-politica-16/

* "Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento? Onde está o conhecimento que perdemos na informação?" 


sexta-feira, 1 de abril de 2011

Sem esquecimento, sem perdão, sem temor

Hoje é dia de lembrar o quanto vale nossa democracia # 64 Nunca Mais...

O golpe de 1964 não é apenas passado, nem foi só obra de generais hoje aposentados e mortos. Quando um deputado diz ter saudade da ditadura, quando um candidato presidencial se alia a generais de pijama e a organizações de ultra-direita, quando um ditador é homenageado por uma turma de formandos de uma escola militar, quando um ministro diz que a Anistia impede a justiça de apreciar crimes contra a humanidade, não estamos diante de saudosismos inconsequentes. Estamos vendo e ouvindo uma parte da elite brasileira dizer o seguinte: quebramos a legalidade e algum dia poderemos voltar a quebrar.

Valter Pomar*, na Carta Maior.

Muitos de nossos amigos latino-americanos não conseguem entender por qual motivo os governos brasileiros pós-ditadura pegaram tão leve com aqueles que romperam com a legalidade, sequestraram, torturaram, mataram e desapareceram.

Neste quesito, os governos pós-ditadura na Argentina, Chile e Uruguai foram muito mais efetivos no combate aos crimes das ditaduras, do que os governos Sarney, Collor, FHC e Lula.

Nossos amigos não entendem, e muitos de nós tampouco entendem, paradoxos como a convivência, no mesmo governo, de uma presidenta que foi presa e torturada, com um general para quem fato histórico é codinome para crime que merece ser perdoado. Ou de ministros que defendem a Comissão da Verdade, com outros para quem a Lei da Anistia imposta pela ditadura permite que autores de crimes contra a humanidade escapem de julgamento.

A persistência desta situação revela, mais do que a força da direita, a incapacidade que parte da esquerda tem de perceber os riscos que corremos ao agir desta forma. Afinal, o golpe de 1964 não é apenas passado, nem foi apenas obra de generais hoje aposentados e mortos.

O golpe de 1964 foi a resposta dada por uma parte da elite brasileira, contra um governo progressista. Foi uma das batalhas da guerra travada, ao longo de todo o século XX, entre as vias conservadora e progressista de desenvolvimento do capitalismo brasileiro.

A via conservadora é aquela que desenvolveu o capitalismo, preservando os piores traços de nosso passado escravista e colonial. A via progressista é aquela que buscou e busca combinar crescimento capitalista, com reformas sociais, democracia política e soberania nacional.

O golpe de 1964 foi executado por uma coalizão cívico-militar. Os militares foram o partido armado do grande empresariado, do latifúndio e dos capitais estrangeiros. Muitas das empresas envolvidas no golpe, ou que cresceram durante o período da ditadura, seguem atuantes. As Organizações Globo, por exemplo.

Hoje, prossegue a guerra entre aquelas duas vias de desenvolvimento. O governo Dilma, assim como o governo Lula, constituem expressões atuais da via progressista. E a campanha reacionária feita por Serra, nas eleições presidenciais de 2012, traduziu os sentimentos e os interesses dos legítimos defensores da via conservadora (alguns dos quais, é bom dizer, buscaram e encontraram abrigo do lado de cá).

Quando um deputado diz ter saudade da ditadura militar, quando um candidato presidencial se alia a generais de pijama e a organizações de ultra-direita, quando um ditador é homenageado por uma turma de formandos de uma escola militar, quando um ministro diz que a Anistia impede a justiça de apreciar crimes contra a humanidade, não estamos diante de saudosismos inconsequentes.

Estamos, isto sim, vendo e ouvindo uma parte da elite brasileira dizer o seguinte: quebramos a legalidade e algum dia poderemos voltar a quebrar; desconsideramos a voz das urnas e algum dia poderemos voltar a desconsiderar.

Uma esquerda que defende os direitos humanos de maneira consequente, deve lembrar que a impunidade dos torturadores de ontem, favorece os que hoje torturam presos ditos comuns. Uma esquerda que defende uma via eleitoral, tem motivos em dobro para ser implacável contra os que defendem a legitimidade de golpes. E uma esquerda que se pretende latinoamericanista precisa lembrar que o golpe de 1964 foi, em certo sentido, o início de um ciclo ditadorial que se espalhou por todo o continente.

E que ninguém ache que golpes são coisas do passado. Honduras, bem como as tentativas feitas no Equador e Venezuela, Bolivia e Paraguai, mostram que os Estados Unidos e parte expressiva das elites locais têm uma visão totalmente instrumental da democracia. E o reacionarismo atual de parte das chamadas classes médias não deixada nada a dever frente aquele que mobilizou, em 1964, as marchas com Deus, pela Família e pela Propriedade.

Por tudo isto, temos todos os motivos para dar o exemplo. Como nossos amigos de outros países da América Latina, não devemos temer, não podemos esquecer e não podemos perdoar.

(*) Valter Pomar é membro do Diretório Nacional do PTAna Recalde em 31 março 2011 às 16:22


Ana Recalde em 31 março 2011 às 16:22