Amizade nossa ele não queria acontecida simples, no comum, no encalço. Amizade dele, ele me dava. E amizade dada é amor. G. Rosa

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Vinícius o poeta das paixões.

Revisitando as paixões de Vinícius de Moraes

-- Vinícius e Gilda --



Não lembro mais exatamente por que razão andei um dia desses relendo a biografia  aliás excelente  de Vinícius de Moraes escrita por José Castello, O Poeta da Paixão (2005). Vinícius, sobre ser um dos nomes mais importantes da cultura brasileira na segunda metade do século passado, foi um desses artistas integrais que fazem da própria vida parte visceral da arte que produzem – ou vice versa, pouco importa. São, por assim dizer, artistas do lado de dentro e do lado de fora da pele. Vivem poeticamente, o que na maioria das vezes, considerando os homens comuns que quase todos somos, quer dizer irresponsavelmente. Nem todos são assim. Dois dos nossos maiores nomes, Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade, por exemplo, só eram artistas no que escreviam.. Ambos servidores públicos exemplares, levaram uma vidinha chocha, protegidos no que, a propósito do primeiro, Mário de Andrade chamou de “funcionarismo garantido”. (Atenção, senhor revisor: “funcionarismo” – foi assim que Mário escreveu!)

Vinícius, não. Funcionário concursado do Itamaraty, foi demitido pelo regime militar, mas não exatamente porque fosse um subversivo. Ainda que o estilo dissoluto de vida que levava não agradasse aos sisudos generais brasileiros  que, aliás, naqueles tempos botocudos não precisavam de grandes razões para expulsar da administração pública quem desejassem , a verdade é que o querido “Poetinha” deu carradas de razões jurídicas para ser expelido do Ministério das Relações Exteriores: simplesmente não comparecia ao batente. Conta uma versão apócrifa que o general Costa e Silva teria dado no seu processo de demissão um despacho impublicável: “Ponha-se esse vagabundo para trabalhar”. Vai ver que é lenda. Mas, como disse aquele personagem num filme clássico de John Ford, quando a lenda é mais interessante do que a prosaica verdade, publica-se a lenda! A ser verdade, aliás, Vinícius certamente teria morrido de rir  e, sem opção, aceitou o veredicto: pôs-se a trabalhar. E que obra produziu! Mas percebo que cheguei ao meio do artigo e não entrei no assunto anunciado no título. Vamos lá!

Em algum momento da leitura do livro de José Castello alguma coisa me incomodou: o excessivo “idealismo”, por assim dizer, com que o autor trata a antológica paixão de Vinícius pelas mulheres. Figuras como ele costumam gerar um fenômeno curioso que talvez não seja correto qualificar como mal entendido, mas que, em todo caso, contém elementos que dele se aproximam: as pessoas costumam tolerar e até admirar em personagens de exceção aquilo que não suportariam no universo das pessoas comuns de que fazem parte. Provavelmente a psicanálise teria alguma coisa a dizer sobre o assunto, mas já gastei muito latim até aqui e não posso me perder de novo. Volto assim ao tema das paixões do “Poetinha” pelas mulheres. Ah, as mulheres! Não conheço uma que não se derreta com o “Soneto da Fidelidade”: “De tudo / Ao meu amor serei atento” etc. etc. Pois bem. Todas elas gostariam que seus homens fossem eternos “vinícius”, esquecendo que o próprio, como homem, foi sempre um prosaico “finícius”!

Ih… Acho que exagerei num jogo de palavras forçado. Mas, como dizia, incomodou-me a aura de mistério com que José Castello cerca as paixões do poeta, ao falar do “amor como enigma”, do “amor como a mais irracional das razões”  e por aí vai. Francamente, não vejo nada disso. Acho que essas palavras altissonantes atribuem grandeza ao que é simples desejo literalmente (e, juro, sem nenhuma intenção pejorativa) baixo  do lado de baixo da cintura, quero dizer. Além disso, nada misterioso, porque regular. Em determinado momento da minha releitura pus-me a catalogar a idade das nove mulheres com quem Vinícius casou. Um sociólogo, para irritação nossa, se deliciaria com os resultados a que cheguei. Tati: sem informação (mas devia ser mais ou menos da mesma idade, porque eram ambos igualmente jovens e foi seu primeiro casamento); Regina: 9 anos mais jovem; Lila: 18 anos mais jovem; Lucinha: sem informação; Nelita: 30 anos mais jovem; Cristina: 26 anos mais jovem; Gesse: 26 anos mais jovem; Martita: “quase” 40 anos de diferença; e, finalmente, Gilda – idade para ser a neta…

Vamos e venhamos, irritado e incomodado leitor: onde está o mistério? Mistério é se ele tivesse se apaixonado por Dercy Gonçalves!

por Luciano Oliveira 

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